Checklist do IR 2025: veja como declarar certo para evitar a malha fina
Especialistas explicam como manter a organização financeira, conferir dados e evitar os principais erros que levam contribuintes à malha fina da Receita Federal
Declarar o Imposto de Renda (IR) exige mais do que preencher campos no sistema da Receita Federal. Envolve organização, atenção aos detalhes e conhecimento das regras fiscais. Ainda assim, milhares de brasileiros caem na malha fina todos os anos, principalmente por erros evitáveis, omissões e inconsistências nos dados informados. Ao entender o que pode ser deduzido, como documentar despesas e quais informações precisam estar cruzadas corretamente, o contribuinte não apenas evita a malha fina – nome popular da malha fiscal -, mas também se protege de penalidades severas e até de problemas judiciais. Nesta reportagem, especialistas fornecem estratégias e dicas para evitar problemas com o Fisco.
Carlos Pinto, diretor do IBPT, destaca que os principais motivos que levam pessoas físicas a serem retidas pela Receita estão relacionados à omissão de rendimentos e à inconsistência nas informações declaradas. “Um alerta que eu dou é relativo ao Pix, porque existe controle sobre essas transferências. Se alguém declara que pagou e não declara que recebeu, isso já gera uma divergência que pode levar à malha fina”, explica. Além disso, despesas médicas que não ocorreram, lançadas apenas para tentar reduzir o imposto a pagar, são alvos frequentes de cruzamentos de dados pelo Fisco.
Para evitar esse tipo de problema, Pinto recomenda que o contribuinte mantenha ao longo do ano o registro e a guarda de todos os documentos que possam ser utilizados para dedução, como recibos médicos e escolares. “Isso deve estar bem alinhado com o orçamento pessoal”, afirma, ressaltando que, embora a declaração esteja cada vez mais pré-preenchida, a responsabilidade pelo conteúdo segue sendo do contribuinte.
A falta de organização é também apontada por Joyce Silva, especialista em gestão tributária da consultoria SOUZAMAAS, como uma das principais causas de inconsistência nas declarações. “Existe cruzamento de dados para a maioria das informações fiscais, e muitos contribuintes não se atentam ao fato de que tudo o que é declarado deve estar em sintonia com o que terceiros também informam — como médicos, escolas e fontes pagadoras”, diz. Segundo ela, além dos próprios dados, o contribuinte deve considerar o que é informado por cônjuges, dependentes, inquilinos e alimentandos. “O erro mais comum está na omissão de rendimentos, principalmente quando há mais de uma parte envolvida.”
Silva ainda reforça que a preocupação com o IR deve durar o ano inteiro, não apenas no período da entrega da declaração. “O maior erro está em não arquivar adequadamente os comprovantes e deixar para cobrar prestadores de serviços apenas no início do ano seguinte, quando o prazo já está correndo.” Ela recomenda mapear todas as movimentações patrimoniais — como venda ou doação de bens, participações societárias e recebimentos de aluguéis — e entender a tratativa fiscal desses eventos no momento em que ocorrem. Perguntas como “há imposto devido nessa transação?”, “quem deve recolher?” e “qual o prazo para isso?” ajudam a evitar problemas e a manter a conformidade com o Fisco.
Além das consequências istrativas, há implicações jurídicas relevantes. Guilherme Di Ferreira, advogado tributarista no Lara Martins Advogados, explica que a diferença essencial entre erro e fraude está na intenção do contribuinte. “Erro é uma inconsistência involuntária, como lançar um valor incorreto ou esquecer um rendimento. Já a fraude e a sonegação fiscal pressupõem a intenção de enganar o Fisco — como na omissão proposital de rendimentos ou uso de documentos falsos.”
As penalidades variam conforme a natureza do erro e a presença de dolo. Nos casos sem dolo, a multa pode ser de 1% ao mês de atraso na entrega da declaração, limitada a 20% do imposto devido. Já a omissão de rendimentos implica multa de 20% sobre o valor devido. “Em situações com dolo ou fraude, a multa pode chegar a 150% do valor do tributo omitido, além de possibilidade de denúncia criminal com base na Lei nº 8.137/1990”, alerta Guilherme. Também incidem juros moratórios calculados com base na taxa Selic.
Organização e atenção aos detalhes: como evitar erros no Imposto de Renda
Declarar corretamente o Imposto de Renda não é apenas uma questão de cumprir uma obrigação fiscal — é uma forma de assegurar seus próprios direitos, como a restituição, e evitar dores de cabeça com a Receita Federal. Para isso, especialistas apontam que o segredo está na organização ao longo do ano, no controle rigoroso de dados financeiros e na conferência cuidadosa antes do envio da declaração.
O diretor do IBPT reforça que o controle das finanças pessoais é o ponto de partida para uma boa declaração. “Uma das formas mais eficazes de garantir o que se tem direito a restituir é manter um orçamento detalhado, com um livro-caixa pessoal onde se registre tudo que se paga e tudo que se recebe. Isso vai além de olhar apenas o extrato bancário”, explica. Ele chama a atenção para movimentações entre contas de cônjuges. “A Receita não tem como saber que marido e mulher são casados, a não ser que estejam vinculados nas declarações. Então, essas transferências precisam estar bem documentadas e justificadas.”
A conferência da declaração também deve ser feita com rigor. “É essencial simular antes no ambiente de teste e checar se todos os valores, CNPJs e vírgulas estão corretos. Não tem mágica: é revisar com cuidado”, afirma Carlos Pinto.
Silva complementa com orientações práticas sobre o arquivamento dos documentos. Para a gestora tributária, a melhor maneira de se organizar é digitalizar os comprovantes e armazená-los em nuvem — como Google Drive, OneDrive ou iCloud. “Isso facilita na hora da declaração, especialmente para quem opera no mercado financeiro. Às vezes o informe do banco não traz tudo, e uma planilha própria com ganhos e perdas pode ser fundamental”, diz.
Outra ferramenta útil é o rascunho da declaração, disponível no portal e-CAC e no aplicativo “Meu Imposto de Renda“, que permite ir preenchendo os dados ao longo do ano. “Com a declaração pré-preenchida, o tempo que o contribuinte gasta hoje é muito mais de conferência do que de preenchimento. Mas conferir é essencial, principalmente despesas de saúde e rendimentos que sobem automaticamente”, alerta Joyce Silva. Também é importante checar se os dependentes não foram declarados em duplicidade por mais de uma pessoa e se há coerência entre variação patrimonial e renda — discrepâncias podem levantar suspeitas.
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Se mesmo com todos os cuidados um erro ar despercebido e o contribuinte for parar na malha fina, o caminho não precisa ser motivo de pânico. Di Ferreira explica que o contribuinte tem direitos garantidos e pode corrigir a declaração espontaneamente. “A retificação deve ser feita no mesmo sistema da Receita Federal e não exige justificativa. Mas precisa ocorrer antes de qualquer intimação fiscal, conforme o artigo 138 do Código Tributário Nacional”, diz o advogado tributarista.
Caso a retificação gere imposto a pagar, incidem multa de mora de 0,33% ao dia, limitada a 20%, além de juros pela taxa Selic. A retenção pela malha fina ocorre quando há inconsistência, omissão de rendimentos ou deduções consideradas suspeitas. Mas não há penalidade automática. “O contribuinte tem direito a saber o motivo da retenção, apresentar documentos eletronicamente ou por agendamento presencial, e exercer o contraditório e a ampla defesa, com apoio de um contador ou advogado, se desejar”, afirma Di Ferreira.
Antecipar-se à Receita é a melhor defesa. Organizar os documentos, manter registros fiéis da movimentação financeira e revisar com atenção são atitudes que não só evitam problemas como também ajudam o contribuinte a maximizar seus direitos — incluindo a tão esperada restituição.
Todo contribuinte está sujeito a erros — e a Receita está cada vez mais preparada para identificá-los
Independentemente do perfil, todo contribuinte pode cair na malha fina se não mantiver uma boa gestão das suas informações fiscais. A complexidade das fontes de renda e o nível de organização individual são fatores determinantes para o risco de inconsistências, omissões e problemas com a Receita Federal.
Carlos Pinto ressalta que o risco é generalizado: “Todos os contribuintes estão sujeitos a erros, independentemente do perfil. Quanto maior o número de obrigações a serem lançadas, mais eficiente precisa ser o controle”, alerta. Ele lembra que aposentados, por exemplo, precisam guardar os recibos de gastos médicos; já quem tem múltiplas fontes de renda, como aluguel e investimentos, precisa estar atento aos lançamentos corretos e consistentes. “Hoje, os bancos e plataformas já informam parte dos dados à Receita. Mas isso exige ainda mais conferência por parte do contribuinte. O processo se torna cada vez mais um ‘cross check’ do que um preenchimento manual”, explica.
Joyce Silva concorda: não há um único perfil de risco. Cada tipo de contribuinte apresenta desafios específicos. “Assalariados costumam ter mais facilidade porque recebem informes prontos, mas precisam estar atentos a gastos dedutíveis e vínculos encerrados durante o ano. Já os autônomos têm mais dificuldade por não contarem com uma fonte pagadora centralizada, recebendo via Pix, cartão ou dinheiro. Sem controle rigoroso, é fácil omitir rendimentos ou lançar despesas sem comprovante”, afirma.
No caso de investidores, os erros são mais técnicos. “É comum esquecer que certas operações exigem apuração mensal, e muitos confiam apenas nos informes das corretoras, o que é arriscado. Já os aposentados tendem a cometer erros por falta de conhecimento: muitos acreditam que toda aposentadoria é isenta, o que não é verdade — apenas parte dela é, acima dos 65 anos e dentro de um limite legal”, explica Joyce.
A recomendação geral é de que, quanto mais diversificadas forem as fontes de renda, maior deve ser o cuidado. A omissão de valores, duplicação de lançamentos ou erros de classificação são comuns e potencialmente problemáticos.
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No entanto, Guilherme Di Ferreira adverte que nem todo erro é tratado da mesma forma pela Receita. Há uma diferença jurídica clara entre equívoco e fraude. “A responsabilização criminal exige a comprovação de dolo, ou seja, a intenção de enganar o Fisco. Casos como a declaração de despesas inexistentes, falsificação de documentos, ocultação de patrimônio ou uso de laranjas podem configurar crimes previstos na Lei nº 8.137/1990, com penas de dois a cinco anos de reclusão, além de multa”, afirma.
O advogado destaca pontos de atenção importantes, como declarar bens pelo valor de aquisição (sem considerar valorização de mercado), informar corretamente os aluguéis recebidos de pessoas físicas — com o devido recolhimento mensal via Carnê-Leão — e não omitir investimentos, criptoativos ou rendimentos no exterior. “Evitar a utilização de contas ou bens em nome de terceiros também é fundamental. Além da multa de até 150% sobre o valor do imposto devido, essas práticas podem configurar crimes como lavagem de dinheiro e falsidade ideológica”, reforça.
Em tempos de cruzamento automatizado de dados e pré-preenchimento da declaração, a Receita Federal conta com um poder de fiscalização cada vez mais apurado. Cabe ao contribuinte se antecipar com organização, consistência e responsabilidade — tanto para evitar malha fina quanto para se manter dentro dos limites legais.